Nosso Brasil continua sendo um país das incoerências econômicas, políticas e sociais.
A repercussão que teve a PEC das Empregadas Domésticas confirma isso. Fez-se justiça, é óbvio, mas com um atraso de quase 25 anos porque a Constituição Federal de 1988 contém, em seu artigo sétimo, 34 Incisos estabelecendo direitos aos trabalhadores urbanos e rurais e reserva para os empregados domésticos apenas nove desses Incisos. Ou seja, a chamada Constituição Cidadã exclui os trabalhadores domésticos de 25 direitos que são concedidos aos demais empregados. É uma discriminação constitucional vista até agora normal pela sociedade brasileira. È como se o trabalhador doméstico não fosse de fato um trabalhador.
O Inciso XXXIV do Artigo 7º da Constituição Federa, prevê, em seu Parágrafo único:
“São assegurados à categoria dos trabalhadores domésticos os direitos previstos nos incisos IV (salário mínimo), VI (irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo), VIII (décimo terceiro salário com base na remuneração integral ou no valor da aposentadoria), XV (repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos), XVII (gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal; ) XVIII (licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias), XIX (licença-paternidade, nos termos fixados em lei), XXI (aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei); e XXIV (aposentadoria), bem como a sua integração à previdência social”.
Assim, nada mais justo e com muito atraso, do que fazer a correção da discriminação constitucional dando aos trabalhadores, sem distinção de atividades, os direitos básicos constitucionais. Fez-se justiça social!
Porém, justiça social não deve ser privilégio de nenhuma categoria profissional nem social. Ao analisar as informações para a declaração do imposto de renda da Pessoa Física para o exercício 2012, ano base 2013, deparamo-nos com a seguinte orientação restritiva (com grifo nosso):
“A dedutibilidade de valores a título de contribuição patronal paga à Previdência Social na condição de empregador doméstico:
a) está limitada:
– a um empregado doméstico por declaração, inclusive no caso da declaração em conjunto;
– ao valor recolhido no ano-calendário de 2012;
b) não pode exceder:
– ao valor da contribuição patronal calculada sobre um salário mínimo mensal, sobre o décimo terceiro salário e sobre a remuneração adicional de férias, referidos também a um salário mínimo;
Estamos nos referindo aos exercícios de 2012 e 2013, mas desde que surgiu a obrigatoriedade da contribuição previdenciária para os domésticos que estes limites não se alteram.
Com a aprovação da nova lei para os empregados domésticos, nivelando-os em termos de direitos trabalhistas aos demais trabalhadores esperam-se que tais restrições desapareçam das instruções do Imposto de Renda porque a todos os trabalhadores é permitido pagar um valor mensal pelos seus serviços superior ao salário mínimo e as empresas podem empregar mais de um trabalhador. Para o doméstico a lógica é a mesma. Quem pode arcar com os pagamentos de diversos empregados, assegurando-lhes os direitos constitucionais, não deve estar limitado a fazer as dedutibilidades de valores na Receita Federal. Ou melhor, o limite é o valor pago.
Além disso, se os domésticos foram equiparados aos demais trabalhadores para fins dos direitos trabalhistas, o que é justo, fica difícil manter a diferença entre os empregadores. Quem emprega doméstico deveria poder abater não só as contribuições previdenciárias integrais mas também os salários pagos, como acontece com as empresas, para fins do imposto de renda.
As Instruções Normativas do Imposto de Renda não estão, hierarquicamente, acima da Constituição Federal.
Salvador, 30 de março de 2013.
Carlos Pessoa dos Santos
(*) Consultor na área de Relações do Trabalho